Campos Altos/MG
14h27 15 Setembro 2021
Atualizada em 15/09/2021 às 14h44

Exemplo: campos-altense que trabalhou na ONU ganha o mundo e faz mestrado em uma das melhores universidades da Ásia

Maria Eugênia é oceanógrafa, mergulhadora, cientista e trabalhou para renomadas organizações como WWF-Brasil e a ONU Meio Ambiente do Reino Unido.
Por Marcelo The Back - Jornalista - MTB: 0020754/MG
Arquivo Pessoal
Maria Eugênia na Tailândia

Para os campos-altenses que sonham em investir nos estudos, ter uma carreira de sucesso e viajar pelo mundo tem na própria cidade um exemplo de determinação a seguir. Maria Eugênia Fernandes Freitas é de Campos Altos, é oceanógrafa, mergulhadora, cientista e já trabalhou para renomadas organizações como WWF-Brasil e a ONU Meio Ambiente do Reino Unido. Estudou na melhor universidade da América Latina e agora é a primeira brasileira a entrar no mestrado em uma das melhores universidades da Ásia. A reportagem da TV KZ conversou com ela para contar um pouco de sua trajetória.

Desde criança, Maria gostou muito de estudar e sempre foi curiosa por natureza.  Essa curiosidade e estímulo de seus professores e professoras sempre a fizeram buscar mais nos livros a entender como o mundo funciona. Ela pontua:

“Sou muito grata às minhas queridas professoras e professores do Pitágoras, Padre Clemente e CEFET-MG (Araxá), que me incentivaram de várias maneiras na construção do meu futuro, para além do próprio ensino em si, bem como a acreditar que eu poderia chegar aonde eu quisesse através da educação!”  

Assim, ela trilhou um longo caminho. Saiu de Campos Altos com 16 anos para fazer o curso técnico de Mineração no CEFET-MG à noite e o ensino médio durante o dia em Araxá, e lá descobriu seu amor pela ciência. 

“Sempre gostei de praticamente quase todas as matérias, então foi bem difícil me basear apenas nisso para decidir o que eu faria na graduação. E é tão difícil tomar uma decisão aos 17 anos do que você vai fazer ou acha que vai fazer para o resto da vida, não é?! Então o curso técnico me ajudou a perceber com qual área me identificava mais. No curso percebi que meu amor pelas Exatas era mais forte, porque unindo física, química e matemática conseguia entender tudo que acontecia ao meu redor. E foi assim que decidi ir para a área de Exatas unindo a área ambiental”, disse Maria Eugênia à reportagem da TV KZ.

O curso no CEFET-MG foi essencial para abrir os olhos da Maria Eugênia no seu caminho como cientista. E então ela pesquisou quais eram as melhores universidades do país tanto no ensino quanto que desenvolviam pesquisas científicas. Nesse momento ela decidiu ir morar em Campinas para estudar no cursinho que preparava para essas universidades, conhecidas pelos vestibulares mais difíceis do país: USP, UNICAMP, ITA e UNESP. 

Ela passou tanto na UNICAMP quanto na Universidade de São Paulo (USP), mas optou pela USP por dois motivos: 1 - Porque a USP é considerada a melhor universidade da América Latina em vários rankings internacionais e recentemente este ano novamente pela Times Higher Education. E 2 por ser no curso que unia seus interesses: Oceanografia. 

Por que é importante estudar os oceanos?

“Pra começar os oceanos que são o pulmão do mundo e não a Amazônia, porque mais de 50% do oxigênio que a gente respira vem do fitoplâncton que está nos mares. Outra coisa bem legal de contar é que sem os oceanos, nós estaríamos literalmente fritos aqui agora haha porque eles regulam o nosso clima. Com a evaporação da água dos mares, temos a circulação atmosférica retornando à água como chuva e neve, restaurando rios, lagos e aquíferos. É um ciclo perfeitamente interligado, então sem eles não há floresta, não há lavouras, não há regulação do ambiente feita pelos ecossistemas e organismos, não há alimentos…

Logo, destruindo os oceanos, nós acabamos com a biodiversidade, impactamos o turismo, a economia, transporte de mercadorias… Pois estamos completamente interligados. Sem os oceanos, todas as formas de vida sofrerão consequências, principalmente a nossa, mesmo quem mora longe do mar. Então a Oceanografia é a profissão que estuda o oceano e a zona costeira, os impactos do homem nesse bioma tão lindo, e luta para sua conservação. Nossos professores carinhosamente nos chamam de “Médicos do Oceano”. haha” 

E quanto ao curso de Oceanografia em si? 

“A Oceanografia estuda os processos físicos, químicos, biológicos, geológicos e sociais de uma maneira integrada, que ocorrem nos oceanos, e na zona costeira, ou seja, em manguezais, estuários e praias. Muita gente confunde com biologia marinha hahaha mas o nosso curso é de exatas, temos 4 cálculos, muitas físicas, químicas, enfim, é bem pesado nessa parte. Resumidamente o que a gente faz é coletar (com barcos ou navios), analisar e interpretar diversos tipos de dados, e com isso apontar soluções através da nossa pesquisa.”

Em quais áreas pode atuar um Oceanógrafo?

O oceanógrafo pode seguir carreira acadêmica nas universidades e institutos de pesquisa, no terceiro setor (ONGs), em órgãos públicos, em secretarias municipais e estaduais de meio ambiente, em órgãos internacionais como a ONU, UNESCO, COI e pode prestar consultoria ambiental pra iniciativa privada ou órgãos governamentais. Um exemplo mais prático é que nós somos os profissionais que sabemos se é possível colocar uma plataforma de petróleo num lugar, porque estudamos as correntes, ondas, organismos que vivem ali, as mudanças sazonais, etc.”

O que você está cursando no mestrado? 

“Desde 2017 já na graduação me envolvi na parte de pesquisa sobre poluição de resíduos sólidos nos rios e mares, participei de vários projetos, debates com parlamentares, comunicação desse assunto em palestras, congressos. Minha pesquisa foi sobre as trajetórias de resíduos plásticos no oceano Atlântico, quais áreas eram mais afetadas por esse lixo, e isso pode dar um panorama para os tomadores de decisão combaterem o lixo na fonte, o que ajuda nas políticas públicas também. Então sempre estive envolvida nesse tema, e com uma pesquisa na internet descobri o mestrado que estou fazendo agora chamado “Combate ao Lixo Plástico no Mar” no Instituto Asiático de Tecnologia uma universidade internacional na Tailândia, a única instituição no mundo que tem mestrado focado nesse tema, com bolsa do Governo do Japão.”

Por que estudar na Tailândia?

“O mestrado aqui é uma ótima oportunidade de estar em contato com pessoas, iniciativas e tecnologias de ponta para combater o problema do lixo no mar, porque eles estão investindo muito nesse tema, já que os 20 principais rios que mais poluem os oceanos estão na Ásia. Além de estar onde o problema mais acontece, é uma oportunidade incrível viver numa cultura completamente diferente, te faz enxergar a vida com outros olhos. 

Outra coisa que foi crucial para que eu tentasse vir foi ver o descaso que o Governo tem em relação a educação e a pesquisa no Brasil, com tantos cortes em bolsas de pesquisa, isso faz a gente querer também buscar oportunidades fora com certeza. Falo no plural porque tenho várias amigas fazendo mestrado, doutorado e pós doc fora por causa disso, nós não somos valorizadas no Brasil na nossa profissão, infelizmente. E só a ciência pode trazer soluções para nossa sociedade em todas as áreas. Se não fosse a ciência não teríamos vacinas, como vocês bem sabem, mas nós cientistas seguimos desvalorizados. É uma realidade triste que devemos mudar para avançarmos no Brasil.” 

Por que estudar lixo no mar? 

“A má gestão de resíduos sólidos é um problema urgente e global. A partir de descarte incorreto dos resíduos temos a poluição dos rios, do nosso solo, das plantações, do nosso ar e mares. As pessoas não pensam muito nisso porque elas acham que não impactam elas diretamente. Mas na verdade temos muitos exemplos desse impacto no nosso dia a dia. Pra citar só um exemplo super urgente, quando há descarte de uma sacola por exemplo na natureza, ela se quebra em pedaços cada vez menores e esses pedaços se tornam microplásticos. Esses microplásticos nós já podemos encontrar na nossa torneira, no sal de cozinha, no ar que respiramos, nos peixes que comemos, e já encontraram até na placenta humana. Pra ver o quão urgente é… chegou até esse ponto, de estar dentro de nós. 

Pra vocês terem uma ideia estimam que estejamos comendo 5g de plástico por semana, o que equivale a massa de um cartão de crédito. E é importante entender quais impactos isso pode trazer pra nossa saúde, daí vem as pesquisas. Estudar como combater o lixo no mar é promover uma vida mais saudável pra todos os organismos até nós, já que 80% do lixo no mar hoje vem das cidades, então combater o lixo no mar começa nos nossos municípios, começa por nós. Por isso é importante estudar esse tema, para fazer algo para entender suas fontes, maneiras de combater e como cobrar as empresas, nossos governantes em aderirem uma responsabilidade compartilhada do problema que também é deles. 

Se não fizermos nada agora pra combater todo e qualquer tipo de poluição que continuamos lançando no nosso planeta, não teremos mais nada para deixar para futuras gerações além de toneladas de plástico, materiais tóxicos e CO2 na atmosfera. Eu quero que tenha vida após a minha, por isso estudo para deixar um mundo melhor para quem vier.”

Qual conselho você deixa para os jovens da nossa cidade?

"Gostaria de falar algumas coisas que fazem sentido pra mim… a primeira delas é que a educação transformou a minha vida e pode transformar a sua também! Vejo a educação como a ferramenta mais importante de transformação social, ambiental, política, cultural e econômica que precisamos na nossa sociedade e nas nossas vidas. Sem educação não construímos pensamentos críticos e ações relevantes que mudam nossas realidades e diminuem as desigualdades. Então aproveite se você tem o privilégio de poder estudar, use da internet como uma boa ferramenta para isso, e se permita sonhar grande, nunca duvidando de você por causa das suas origens. Sempre gostei muito desse trecho da música, Mais Uma Vez do Legião Urbana: “nunca deixe que lhe digam que não vale a pena acreditar nos sonhos que se tem, ou que seus planos nunca vão dar certo, ou que você nunca vai ser alguém!” :)

Como já ouvi tanto “conhecimento é a única coisa que ninguém pode tirar de você” e isso é tão real! 

Você não precisa estar na melhor universidade para se destacar ou ter as melhores oportunidades no mercado de trabalho, porque o que faz a gente se destacar é aprender a aprender todos os dias, nunca parar de estudar, tomar iniciativas e ir fazendo seu networking. Então no final o que mais vai importar é o caminho que você escolheu trilhar, no que você quer colocar sua energia, pensar na educação como um investimento a médio-longo prazo, o quanto você se dispôs a tentar, a errar e a abraçar as oportunidades, que vão te dar não só um diploma, mas experiências e vivências que te transformam como pessoa e profissional.

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