Pela terceira vez, o Ministério da Educação (MEC) prorrogou nesta sexta-feira, 9, a proibição da criação de novos cursos e vagas em educação a distância (EAD) no ensino superior privado. Desde junho do ano passado, o governo federal promete entregar um novo marco regulatório para tentar organizar um setor que cresceu 700% em número de cursos nos últimos anos, com muitos questionamentos sobre a qualidade.
A portaria publicada no Diário Oficial da União afirma que os prazos ficam prorrogados até 9 de junho "ou até a publicação da regulamentação do Novo Marco Regulatório". A data inicial para a publicação das normas por meio de decreto presidencial era 31 de dezembro, quando foi pela primeira vez prorrogada para março, depois para maio e agora para junho.
Segundo o Estadão apurou, a publicação do decreto deve sair nos próximos quinze dias e foi adiada porque o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está fora do País, em viagem a Rússia. O texto já foi feito pelo MEC e está parado na Casa Civil para "últimos ajustes" segundo fontes.
O governo tem analisado nos últimos meses quais seriam os possíveis impactos na popularidade do presidente decorrentes das alterações na regulação do setor, que corresponde a aproximadamente metade das matrículas da graduação no Brasil - em especial entre os mais pobres, que precisam trabalhar durante a faculdade ou que não vivem nos grandes centros. Há pressão também do setor privado para normas que não sejam tão rígidas.
Segundo o Estadão revelou, metade dos 50 mil polos de ensino superior a distância do País deve deixar de funcionar com as novas normas. Segundo o diretor de Regulação de Educação Superior do MEC, Daniel Ximenes, o marco regulatório vai estabelecer uma "estrutura mínima" desses locais, o que levará ao fechamento de muitos deles.
Os polos são ambientes que, em teoria, garantiriam espaço pedagógico para o aluno de EAD em cidades onde não há estrutura de faculdade, mas a legislação de 2017 permitiu que fossem criados sem autorização prévia ou mesmo avaliação do MEC. O governo sequer visita esses locais para que possam funcionar e atualmente há polos que se resumem a salas em cima de padarias ou de postos de gasolina.
O Estadão também mostrou que o governo deve vetar cursos 100% online nas Engenharias e na área da Saúde, em cursos como Medicina, Enfermagem, Fisioterapia, Farmácia e Nutrição, além das Licenciaturas.
O adiamento causa instabilidade no setor de universidades. No Congresso Internacional de Educação a Distância (Ciaed), realizado em Curitiba nesta semana, a expectativa era enorme para que o marco fosse publicado antes dessa sexta, quando terminava o último prazo.
"As escolas não podem criar novos cursos, então existe um impacto muito forte, econômico, sobre as pequenas empresas", diz a conselheira do Conselho Nacional da Educação (CNE) e vice presidente da Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup), Beth Guedes. Em discurso de abertura no evento na quarta-feira, 7, ela foi ovacionada pela plateia formada por integrantes do setor privado que investe em EAD. "O futuro não está nessa estrutura arcaica que nós temos hoje", afirmou.
A demora do marco regulatório também impede o progresso de novos instrumentos de avaliação para o ensino superior, que estão sendo planejados pelo próprio MEC, por meio do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais (Inep). Há, por exemplo, uma nova avaliação in loco das instituições sendo elaborada que não pode ser divulgada antes das regras de EAD, já que elas passarão visitar também os polos de cursos a distância.
Menos de 1% dos 692 cursos de graduação a distância avaliados pelo MEC no último ciclo do Conceito Preliminar de Cursos (CPC) alcançaram nota máxima no indicador federal.
Os dados mostram que apenas seis cursos a distância registraram nota 5, o que representa 0,8% do total. Entre os 9.120 cursos presenciais de graduação avaliados, 492 tiveram conceito mais alto, o que significa 5,3% do total.
Pela primeira vez na história, a maioria dos alunos de graduação em instituições particulares não está mais no ensino presencial no Brasil. De cada 10 alunos que ingressam hoje no ensino superior, 7 vão para a educação a distância.
Parte do setor se sente alijado da formulação das novas normas. Uma petição contra a proposta de regras - que reúne nomes do mercado e especialistas - já reúne milhares de assinaturas. A Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) também lançou manifesto, que questiona a restrição para que cursos de Saúde e Licenciatura funcionem em EAD, já que muitos alunos sofrem com a impossibilidade de cursar uma faculdade física porque moram em locais muito remotos.
Outro ponto criticado pelo setor é a exigência de um número limite de estudantes para as atividades síncronas. Antes de finalizar o texto, o MEC divulgou que haveria um teto de 50 estudantes por turma durante as atividades ao vivo.